quinta-feira, 5 de julho de 2012

PROF. DA UFPA DENUNCIA BIOTA E NORTE ENERGIA AO MPF

 Prof. Dr. Juarez Carlos Brito Pezzuti  

No dia 14 de maio de 2012, o professor do Núcleo de Altos Estudos da Amazônia da UFPA, Dr. Juarez  Juarez Carlos Brito Pezzuti, considerado uma das maiores autoridades em quelônios (tartarugas) do país, realizou denúncia junto a Procuradoria do Ministério Público Federal do Estado do Pará, acusando a empresa Biota, contratada pela Norte Energia de não realizar o manejo dos quelônios de maneira adequada, fato esse que teria culminado com a morte de milhares de filhotes de tartaruga.  
Segundo o professor, o fato também foi denunciado ao Instituto de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). 


"O Taboleiro do Embaubal constitui a mais importante área de desova da Tartaruga-da-Amazônia, Podocnemis expansa, e integra o Programa Quelônios da Amazônia desde seu início, em 1979, sendo suas atividades desenvolvidas inicialmente pelo IBDF,  posteriormente coordenadas pelo IBAMA de Altamira, e atualmente pela Secretaria de Meio Ambiente e Turismo (SEMAT) de Senador José Porfírio (SJP). A UFPA de Altamira vem participando das atividades de proteção e manejo desde 2004, através de trabalho voluntário de alunos de graduação em Ciências Biológicas, e de disciplinas optativas oferecidas na grade curricular do referido curso. Desde 2007, professores da UFPA de Altamira e da UFPA de Belém vêm desenvolvendo pesquisas sobre ecologia reprodutiva de quelônios, em parceria com a SEMAT e o IBAMA", explica o professor.

Ainda segundo ele, "a prefeitura de SJP contava com o apoio da Norte Energia para a realização das atividades de manejo e conservação de quelônios na região do Baixo Rio Xingu, apoio este previsto no Plano Básico Ambiental (PBA) do Aproveitamento Hidrelétrico (AHE) de Belo Monte, sendo isto também previsto como condicionante à emissão da Licença Prévia (LP) do referido empreendimento. O que observou, entretanto, para profunda decepção da equipe composta pelos funcionários da SEMAT e alunos e professores da UFPA, foi completamente diferente".


Mesmo com todo o histórico de cooperação entre a UFPA e a Prefeitura de SJP, o professor diz que a empresa Norte Energia optou por contratar, ainda em 2011, uma empresa de consultoria, chamada  Biota, para realizar o manejo das tartarugas. Segundo ele, "ao invés de procurar apoiar a experiente equipe da SEMAT com décadas de experiência em um manejo bem sucedido, a referida empresa agiu independentemente, recusando-se a interagir e negando-se a fornecer informações indispensáveis para o andamento do próprio manejo, alegando que tinha obrigação contratual de manter absoluto sigilo sobre suas atividades e reportando-se única e exclusivamente à sua contratante, a Norte Energia".


"Em suma, ao invés da Prefeitura poder contar com o justo apoio do empreendedor, determinado no âmbito do próprio licenciamento e considerando a intensificação da pressão sobre as tartarugas em decorrência do próprio empreendimento, esta se depara com um braço do empreendedor agindo a seu bel prazer, administrando por conta própria um patrimônio natural como o Taboleiro do Embaubal.", considera o professor.   
Taboleiro do Embaubal, no Baixo Rio Xingu, a mais importante área de reprodução da tartaruga-da-amazônia em toda a bacia, com uma população estimada de 20 mil fêmeas adultas.

Segundo as acusações, a referida empresa, "queria impedir que professores e estudantes da UFPA se instalassem na base para trabalhar em parceria com a equipe da SEMAT, como vem acontecendo desde 2007, e pretendeu impor restrições quanto ao acesso à área a ser monitorada", finaliza o professor. 

Somente depois de um diálogo entre a Secretaria de Meio Ambiente de Senador José Porfirio, a Universidade Federal do Pará e a empresa Biota é que os pesquisadores da UFPA e seus colaboradores da SEMAT puderam dar inicio ao processo de monitoramento e foi justamente nesse momento que constataram constataram "a falta de experiência e de responsabilidade da empresa sobre os trabalhos, que acabaram ocasionando a morte de milhares de filhotes e o fracasso no salvamento de um numero ainda maior."

Vários erros foram cometidos segundo Dr. Pezzuti, como a movimentação desnecessária das embarcações (muitas vezes indo e voltando da base por terem esquecido utensílios como lanternas, água, etc). Outro problema teria sido a excessiva e desnecessário permanência de pessoas nas praias durante a noite, que teria provocado não só a compactação do solo (que por consequência prejudicaria a postura das tartarugas), como também a iluminação constante das praias durante a noite. Este último procedimento segundo o professor "espanta os animais, e os que estão subindo retornam à água e os que ainda não subiram se afastam. Isto é altamente prejudicial, pois quanto mais tarde os animais desovam, maior a chance de perda de ninhos pelo alagamento."

O professor acusa ainda que a ausência do responsável pela coordenação dos trabalhos durante as marés de lua, os ajudantes de praia (por falta de instrução) não sabiam como proceder para minimizar as perdas dos ninhos pelo alagamento. A empresa teria ainda se se recusado a receber orientações por parte da equipe da SEMAT e da UFPA, sob alegação que tinham “metodologia própria”. 

Na opinião do professor Juarez "o que foi presenciado foi uma total displicência e falta de preparo para manejar ovos e filhotes, gerando grandes perdas que poderiam ter sido evitadas".

Em um outro episódio, relatado pelo professor Juarez Pezzuti, ele conta que no início de dezembro haveria uma maré de lua e que inundaria a parte mais baixa do tabuleiro, como acontece quase todos os anos. Diante da iminente inundação, a equipe da Prefeitura de SJP solicitou apoio de pescadores de diversas comunidades para escavação da parte a ser atingida e retirada dos filhotes eclodidos. Em condições naturais os filhotes demorariam até dez dias para cavarem o substrato e alcançarem a superfície, ocasionando consequente a morte desses filhotes. 

O denunciante alega que ao procurar a equipe da Biota, está se encontrava no Taboleiro retirando filhotes da parte mais alta. "Explicamos para eles (funcionários da Biota) que era necessário dar prioridade para a retirada dos filhotes da parte mais baixa da praia, que estavam mais suscetíveis ao alagamento. A resposta que recebemos é que para a Biota o que importava era produção, então não compensaria investir em ninhos com poucos filhotes vivos, mesmo que eles fossem se alagados primeiro", relatou o professor.   

A equipe da Biota concentrou suas atividades na parte mais alta da praia, que não corria risco de alagamento, e onde os filhotes desse local sairiam naturalmente dentro de alguns dias, sem necessidade de escavar para retirá-los. 

Outro procedimento equivocado inadequado seria a chegada tardia dos funcionários da  empresa Biota nas praias  "quando boa parte dos filhotes já haviam saído dos ninhos e estavam sendo intensamente predados por urubus". 




Grande quantidade de filhotes predados por urubus, que teriam sido salvos se a atividade de retirada dos mesmos do cercado fosse realizada no início da madrugada, quando os mesmos começam a emergir dos ninhos.
O professor Juarez avalia que o "resultado foi uma perda de 10 mil filhotes por predação, enquanto que no ano passado foram perdidos apenas 5 mil com a atuação de apenas cinco pessoas para retirar os filhotes durante a madrugada". 

Outro problema que teria ocorrido e que pode ser sido uma provável causa de mortes das tartarugas foi "o transporte inadequado de filhotes restantes em baldes fechados sem nenhum tipo de ventilação e enchidos com filhotes até o seu limite, o que possivelmente levou à morte de outra parcela dos filhotes, principalmente dos que ficavam no fundo do balde, sob o peso de todos os outros, sem poder respirar".
Filhotes sendo transportados em baldes fechados, comprimindo os filhotes e impedindo-os de respirar
A Empresa teria sido comunicada dos fatos em mais de uma reunião, sendo que a resposta da contratante (Norte Energia), na opinião do professor foi surpreendente. “A equipe da Biota está correta quando afirmou sobre a impossibilidade contratual de fornecimento de dados brutos sem anuência da Norte Energia, pois tais informações são de propriedade do contratante”. “Agradeçemos de antemão a sua preocupação com relação a assuntos internos da Norte Energia”, teriam dito os responsáveis pela Empresa Norte Energia.   

"Desta forma, fica bem claro como a Norte Energia considera que devem ser conduzidas as ações da sua prestadora de serviços no maior santuário de reprodução da tartaruga-da-amazônia, cuja conservação vem sendo conduzida há mais de trinta anos pelo governo brasileiro e que constitui o maior projeto do Mundo na área de conservação de quelônios", pondera Pezzuti.

O professor conclui afirmando que "o Taboleiro do Embaubal é um patrimônio público e uma riqueza natural de valor inestimável, e sua gestão e conservação devem ser realizadas de forma idônea e transparente. Não pode ficar nas mãos de uma empresa cujo empreendimento causa impactos sobre o mesmo, ainda mais sob regime de sigilo contratual, agindo de acordo com seus próprios interesses. É também fundamental que os dados brutos de todos os monitoramentos realizados no âmbito do PBA de Belo Monte sejam disponibilizados para o IBAMA, SEMAT, MP e demais instituições interessadas, tornando-se, desta forma, públicos".

Fonte: Prof. Dr. Juarez Carlos Brito Pezzuti 
Professor Adjunto IV 
Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA
Universidade Federal do Pará – UFPA

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