sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A Guerra no Rio e importância estratégica da retomada dos territórios

Marcelle Figueira*

Uma palavra tem sido corriqueiramente pronunciada, ouvida e reproduzida nas ações da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio e esta palavra é TERRITÓRIO.
Em momentos como esses, vividos hoje na cidade do Rio de Janeiro, é natural que os estudiosos e pesquisadores da área de Segurança Pública se manifestem, seja tanto para ajudar a população a entender as ações, assim como para contribuir, de maneira reflexiva, para identificar quais são os pontos nevrálgicos, caminhos e desafios da Segurança Pública.
Peço minhas desculpas antecipadas aos estudiosos da categoria sociológica "violência", mas desconsiderar a variável espacial, neste momento, limita o alcance das análises, e como geógrafa me uno aos policiais e militares desta ação, afinal como já dizia Yves Lacoste "A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra".
O que acontece hoje no Rio, na minha humilde percepção, também apoiada e construída com base na experiência e em estudos, é a retomada de territórios e espaços urbanos que conferiam vantagem tática aos grupos criminosos.
Esta ação não é a "solução definitiva" contra os grupos criminosos e nem vejo a Secretaria de Segurança Pública apresentá-la assim. A palavra é "retomada de território", e por que retomar território é tão importante?
Porque muito antes de existir polícias e de se pensar em políticas de Segurança Pública, há 5 séculos já se sabia o valor de conquistar espaços enquanto instrumento de manutenção, conquista e exercício de poder.
Sun Tzu disse, no seu badalado "A arte da Guerra" que: "A conformação do terreno é de grande importância nas batalhas. Assim sendo, apreciar a situação do inimigo, calcular as distâncias e o grau de dificuldade do terreno, quanto à forma de se poder controlar a vitória, são virtudes do general de categoria. Quem combate com inteiro conhecimento destes fatores vence, de certeza; quem não o faz é certamente, derrotado" .
Os traficantes ocupam os espaços que podem lhes fornecer uma vantagem tática e estratégica para alí permanecerem, e não é gratuita a denominação ilustrativa de "bunker", "porto seguro", "fortaleza", dentre outros adjetivos para denominar esses espaços.
Retirar os territórios do tráfico é retirar sua vantagem tática, que é fornecida pela característica do espaço concreto das áreas conhecidas como "favelas", onde a desordem da sua arquitetura permite isso. Por isso é tão fundamental o apoio das forças armadas por possuírem equipamentos (vantagem de método) que minimizam a vantagem de comandamento do terreno, que é o que está sendo tomado dos traficantes.
Ocupar o complexo do Alemão irá acabar com a venda de drogas naquela região? Não, pois a territorialidade do tráfico de drogas é uma territorialidade flexível, descontínua e funcional. Irá existir onde houver mercado.
Ocupar o complexo do Alemão vai acabar com a violência? Sim, se o Estado entender que reintegrar este território é levar à comunidade a cidadania de forma completa com: justiça (defensoria pública, mediação e conciliação de conflitos), segurança(pronto-atendimento das chamadas emergenciais, policia comunitária, delegacias convêncionais e especializadas) saúde,educação, cultura e lazer para aquela comunidade.
Polícias são forças territorializadas e poder contar com a presença delas em qualquer lugar da cidade não é, necessariamente, garantia de uma cidade segura e igualitária no acesso aos serviços públicos, mas já é um excelente começo para o Rio retomar o que o carioca mais deseja: o título de Cidade Maravilhosa.
* Geógrafa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro , mestre pelo Instituto Militar de Engenharia e Coordenadora da Graduação Tecnológica em Segurança Pública da Universidade Católica de Brasília.

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