terça-feira, 2 de agosto de 2011

Belo Monte e as aves de rapina*

Quando se ouve falar de “rapinagem” a primeira conotação evidente é tomar para si o que é de outrem. Ave de rapina (que origina o termo) é geralmente metaforizada no contexto político quando diz respeito aos parlamentares desonestos ou, no contexto econômico, quando se refere aos oportunistas que se utilizam da boa fé de consumidores para usurpá-los. Não muito Longe disso, na verdade são aves que raptam, tomam para si pequenos animais com suas garras afiadas. Neste momento, o leitor deverá estar se perguntando: o que tem isso com Belo Monte? Por um acaso a construção da usina deverá atrair mais urubus ou corujas para a região? Não deixa de ser verdade e veremos por que.


É claro que não estamos tratando, literalmente, de animais. São sujeitos, alguns novos e outros antigos, já bem conhecidos. Tais indivíduos se aproveitam de Belo Monte e do o processo de usurpação orientado desde antes da conclusão dos estudos de impactos ambiental (EIA). No âmbito do interesse, obviamente estamos tratando de dinheiro, especialmente de 500 milhões referentes ao Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável (PDRS) e outros recursos que estão escondidos na “rebarba” do empreendimento.
A primeira parte deste montante, do PDRS Xingu, destinado a estimular o crescimento sustentável da região durante e após a construção da usina, deverá ser gerido por um Fórum composto por 16 representantes de várias instituições governamentais e não governamentais da região. A expectativa menos otimista é que haja uma severa divisão, ou melhor, uma pulverização desse recurso entre as diversas esferas de interesse, resultando em poucos benefícios para a região. No final, o que deveria ser um valor aplicado com finalidades em longo prazo, acaba se tornando um viés de ação política, emergencial e, em muitos casos, privado. O que se espera de positivo, então? Que o fórum gestor seja transparente, idôneo e não atravessado por questões de interesses individuais. Infelizmente a história nos mostra o contrário.
No que diz respeito às condicionantes de Belo Monte e ao processo de mitigação dos impactos, os que esperam uma grande transformação local devem ficar decepcionados. A maioria dos itens impostos pelo IBAMA são pontuais e relativos a problemas ambientais específicos, ou seja, quase nada possui implicações sociais relevantes em longo prazo.
Não muito longe de nós, estão a espreita outros usurpadores, são eles os especuladores imobiliários. Quanto a esse aspecto, até os que moram recentemente na cidade de Altamira sabem que os valores atribuídos ao terrenos e aluguéis têm aumentado assustadoramente. Diante disso, questiona-se para onde serão empurrados os novos moradores de Altamira, futuros remanescentes do processo de construção da usina?
Nesse contexto, paira outra grande dúvida por parte da população local: o que sobrará de Belo Monte para os que desejam melhoria em sua qualidade de vida? Ao que se percebe, antes de tomarmos consciência do que nos é devido, as aves de rapina farão seu trabalho, deixando ao nosso deleite uma carcaça fétida e inútil, gerada sob o discurso do desenvolvimento.

*Prof. José Queiro de Miranda Neto - Mestre em Geografia na área de concentração planejamento urbano e regional e professor assistente da UFPA, Campus de Altamira.

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