terça-feira, 26 de outubro de 2010

ASFALTAMENTO DA TRANSAMAZÔNICA: SERÁ O FIM DO “FAROESTE CABOCLO”?

ASFALTAMENTO DA TRANSAMAZÔNICA: SERÁ O FIM DO “FAROESTE CABOCLO”?
Prof. Me. José Q. Miranda Neto*
Em um ponto há concordância entre ambientalistas, engenheiros e movimentos sociais na região de Altamira: “precisa-se de asfalto”. Depois de 36 anos de poeira, lama e enormes atoleiros, fala-se novamente em pavimentação integral da transamazônica (BR-230). Tal como se esperava, não houve grande alarde, uma vez que a população já se encontra “vacinada” da promessa de políticos em pré-campanha eleitoral. A desconfiança não é à toa, dos 486 km entre Marabá e Altamira, apenas alguns pequenos trechos próximos das sedes municipais são asfaltados. O resultado é uma estrada perigosa no verão, devido à poeira que torna impossível ver cinco metros além no nariz, e intrafegável no inverno, pelos alagamentos e atoleiros em diversos pontos da estrada. As promessas de asfalto são antigas, desde a década de 70 (quando terminaram as obras de abertura) até hoje. Viu-se a morte do último general da ditadura sem grandes alterações nessa antiga rodovia que, sem dúvida, foi a vedete do “Brasil Grande” dos militares.
A história da transamazônica confunde-se, portanto, com a própria história da Amazônia, construída no contexto do milagre econômico brasileiro, projetada durante o governo do presidente Emílio Garrastazu Médici (1969 a 1974), viu a redemocratização do país, passou pela década perdida e pelos planos de desenvolvimento de FHC (Brasil em Ação). Enquanto isso, populações inteiras de migrantes originados dos antigos programas de colonização (como as fracassadas agrovilas) vivem em cidades cobertas por espessas nuvens de poeira, numa paisagem mais parecida com as cenas do faroeste americano.
Os programas de colonização fracassaram em gerar desenvolvimento na região, porém deixaram milhares de famílias em relativo isolamento.
Demanda de comerciantes, industriais, agricultores (pequenos e grandes) e mesmo daqueles que adorariam sair em segurança de Altamira para visitar a família nos feriados, o asfaltamento da BR-230 é quase uma unanimidade por aqueles que vivem e sobrevivem na região. Porém, mesmo com o orçamento fechado em 1,2 bilhões no contexto do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal e as licenças ambientais concedidas em setembro de 2010, ainda é difícil acreditar que a antiga transversal da década de 70, abandonada por décadas, vai se transformar num negro “tapete” em toda sua extensão. A resposta é positiva e veremos por que.
Estreitar a relação entre a Amazônia oriental e ocidental sempre foi uma meta do Governo federal, desde a época dos militares. Contudo, atualmente existem fatores que impulsionam essa tarefa, podemos citar, pelo menos quatro deles:
1) A construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, que demanda intenso deslocamento de material e mão de obra antes e durante a construção. Caso a obra dependa somente de transporte hidroviário, estará sujeita a atrasos e passível de riscos, uma vez que o rio Xingu não é navegável em toda sua extensão, dependendo de pequenos canais de ligação sem profundidade suficiente pra grande calado, como o rio Tucuruí, em Vitória do Xingu. Outro fator é político, o Fort Xingu, maior movimento de apoio a Belo Monte e que congrega vários municípios da região, apresentou como condição de apoio o asfaltamento do trecho paraense da rodovia.
2) Outro fator diz respeito ao eixo que liga a BR-230 a BR-163, que dará suporte à crescente agroindústria da soja em Santarém e Belterra. Sabe-se que o asfaltamento da BR-163, que liga Santarém à Cuiabá, será uma opção de escoamento da soja, a outra opção será pela transamazônica. Há, portanto, um interesse em ligar de vez os principais centros urbanos regionais e cidades médias do Pará via terrestre, estabelecendo a relação entre a agroindústria e os principais centros comerciais e produtivos do Estado.
3) A ampliação do pólo industrial em Marabá, com a meta de verticalizar a cadeia mineral no Estado do Pará é outro ponto crucial para a agilização da obra. Um marco desse processo foi a criação da Aços Laminados do Pará (ALPA), às margens da transamazônica, ainda em fase de construção. O dinamismo de Carajás demandará novas rotas de expansão no futuro, como a previsão de construção da Ferrovia Norte-Sul e o próprio eixo da BR-230, em direção à Altamira.
4) Outro fator não menos relevante se refere à tentativa do Estado de se estabelecer a organização do território numa área em que ainda predominam formas de trabalho pré-capitalistas, foco de conflitos pela posse da terra que ganharam visibilidade internacional, como o caso do assassinato da missionária Dorothy Stang. Há, portanto, o interesse em dinamizar o potencial agrícola e agropecuário da região com base na capitalização do setor agrário, como já ocorre em Santarém-Pa.


Transformar o “poeirão” em estrada não é somente uma questão de serviço público, como tenta transparecer o discurso do governo, trata-se bem mais de um assunto de cunho econômico. Os maiores beneficiários serão, então, aqueles que, a partir de agora, mobilizarão suas forças econômicas dentro de um novo espaço de fluxos que se pretende estabelecer por aqui. A partir de 2012, com a finalização das obras, teremos uma nova região, com novas lógicas, novos atores, novos benefícios e novos prejuízos. Como estarão as cidades da transamazônica no futuro? Quais as lógicas que esse novo sistema de fluxos vai criar a partir de então? Será o fim do “faroeste caboclo”, ou seja, da condição de abandono e barbárie presente nas comunidades isoladas? Para conhecer as respostas continue lendo este jornal, pois sempre teremos um novo artigo sobre esse tema. No final de algumas edições talvez possamos traçar um cenário de futuro e, quem sabe, se antecipar e agir politicamente em alguns assuntos de nosso interesse.



*José Q. Miranda Neto é geógrafo, mestre em Gestão do Planejamento Regional pelo PPGEO (UFPa) e professor assistente da UFPA – Campus de Altamira

Um comentário:

  1. PRECISAMOS DO ASFALTO..AO CONTRÁRIO JAMAIS TEREMOS INDUSTRIA.... CUSTO E BENEFICIO... MERECEMOS UMA VIDA DIGNA E HONESTA... FORA CORRUPÇÃO.... NOSSA REGIÃO É RICA EM MATERIA PRIMA.. PRECISAMOS DO PROGRESSO E SUSTENTABILIDADE DA NOSSA AGRICULTURA...

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